De acordo com cientistas políticos ouvidos pelo Estadão, por ter apoio de grande parte da bancada conservadora e da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), que conta com 374 parlamentares na Câmara e no Senado, é possível que a PEC consiga ser aprovada pelo Congresso Nacional.
Para ser aprovada, a PEC precisa ser discutida e votada em dois turnos nas Casas do Legislativo. Na Câmara, é necessário ter mais de 308 votos dos 513 deputados, enquanto que no Senado é preciso ter 49 votos dos 81 senadores. Antes, a proposta deve ser submetida pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e, depois, a uma comissão especial. Diferentemente dos projetos de lei, a emenda à Constituição não precisa passar pela sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Porém, o STF pode suspender a tramitação da PEC ou torná-la inconstitucional após uma eventual aprovação. A Corte poderá utilizar o inciso quarto do artigo nº 60 da Constituição Federal que diz: "Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a separação de poderes".
PEC pode escalar crise política, alerta especialistas
Na análise do cientista político da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Tiago Valenciano, uma aprovação da emenda constitucional pode aumentar a tensão entre os Poderes. Segundo ele, os parlamentares signatários da proposta não devem recuar da sua posição de embate contra o Judiciário, consolidando ainda a disputa pelo protagonismo nas decisões de temas considerados sensíveis.
"Se tiveram a coragem de protocolar, vão seguir adiante, custe o que custar. É um pouco também de se 'jogar com a torcida', pois são deputados engajados politicamente nessa pauta anti- judiciária". disse Valenciano.
O aumento das tensões entre os Poderes também é um alerta dado pelo doutor em direito pela Universidade de São Paulo (USP) Emanuel Pessoa, que enxerga o Legislativo e o Judiciário trocando acusações de interferências em suas atribuições caso a emenda prospere. Na visão do especialista, o Congresso afirmaria que o STF adota o poder de legislar, enquanto que o Supremo diria que os parlamentares tomaram a sua posição de vetar leis e emendas constitucionais.
"O Supremo poderia alegar que isso seria uma interferência na separação de poderes, e aí o Congresso alegaria que o Supremo vive interferindo em assuntos do Legislativo e isso também afeta a separação de poderes. Então, você chegaria em um ponto que você iria escalar tanto uma crise política que você teria que chegar em uma solução de verdade. Hoje, a gente vive de impasse e, no fim do dia, o Supremo sempre ganha", explica o doutor em direito pela USP.
Segundo Tainah Sales, professora de direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a PEC tende a ser declarada como inconstitucional pois prevê que o Congresso pode derrubar uma decisão do STF com votações, sem abordar a possibilidade de audiências públicas e discussões em comissões dentro do Legislativo. Segundo a especialista, essa falta de participação da sociedade civil no 'poder de veto" dos parlamentares pode influenciar em um fracasso da emenda constitucional.
"No processo legislativo, um projeto de lei passa por várias discussões nas comissões permanentes, a sociedade civil participa ou pode participar desse processo através de audiências públicas, além de uma votação em plenário com discussões entre os parlamentares. Nessa proposta de emenda constitucional me parece mais problemática porque ela simplesmente derruba a decisão do STF em uma votação, sem esse amadurecimento democrático", afirma.